domingo, 13 de setembro de 2009
sábado, 12 de setembro de 2009
SUB-SARCÓFAGO
Nada no Sarcófago é fácil e convencional. A corrosão das carnes é dolorosa e incomoda. Abandonamos o atelier/sarcófago de Jayme no pelourinho para adentrarmos no sub-sarcófago, no bunker, no muquifo, localizado na casa do nosso ilustre montador Kico, também conhecido como Marcos Povoas. Ali remexemos, reviramos, dilaceramos e cortamos a carne imagética/sonora colhida. Depois de dois meses de labuta e patologias chegamos enfim ao primeiro corte do filme. Agora é afinar e dar som ao CORPO. Se tudo der certo, o que seria bastante estranho, o filme fica pronto em novembro.
domingo, 24 de maio de 2009
segunda-feira, 27 de abril de 2009
sexta-feira, 24 de abril de 2009
A AUTONOMIA DO CORPO E A RECONFIGURAÇÃO DO DESIGN CONTEMPORÂEO
;Se perguntarmos a um transeunte qualquer, desatento e envolto nos fluxos tecnológicos, na ideologia do trabalho e,sobremaneira, estafado por tudo que lhe chega a partir de uma rede discursiva dita como “atualidade”, pelos equipamentos coletivos de mídia, e por uma sequenciada transmissão de enunciados desconstrutivistas, por uma tal reprodução subjetiva da pior fase do capitalismo, e por uma fabricação desmesurada de máquinas territorializadas - para usar uma expressão de Felix Guttari - o que define a contemporaneidade; certamente não obteremos resposta fácil...Se caminharmos um pouco mais e num recorte intelectual, buscarmos as correntes pós-modernas, tão em voga nesse momento do delírio universal, longe de recorrer a um discurso homogêneo, melodicamente desenvolvido, certamente esses teóricos ajustariam o tema, o conceito e à circunstância, quebrando a possibilidade positivista de definição, dando-lhe amplas possibilidades de significar o design contemporâneo. Ora, diante das mutações da subjetividade, sobretudo aquelas que não podem ser reduzidas a modelos de identidade, diante da desidentificação com o circunstancial controle social – muito embora possamos definir a era do controle como uma evolução do século da disciplina – depois da queda da infra-estrutura marxista, e em plena vigência da representação de estratos heterogêneos da invenção cotidiana – paradoxo do mesmo-diferente, ao invés da produção de uma heterogênese pura - diante das oposições binárias vividas a todo vapor, e de um retrocesso de percurso da produção massiva, o que sobrara para uma tal definição. O corpo? Talvez! Fato é que diante das contradições entre o natural, o artificial, e o cultural, ou melhor, entre a natureza, o artifício e a cultura, demonstrar as virtudes do corpo ainda é o melhor caminho para fugir da encruzilhada dos múltiplos componentes de subjetividade que compõem o contemporâneo...Vou falar como modelo-não-modelizado um corpo-farpas; um corpo-máscara-aranha, confeccionado com tampas de ralo de pia; um corpo tecnológico primitivo; de farrapos com conceitos; do simples com a complexidade de um corpo-design menos atual do que virtual, que é nada mais, nada menos do que a expressão diagramática e movente, instável e mutante, difuso e esquizo, do próprio corpo contemporâneo. Corpo este que não reproduz modelos preexistentes no mass-media, e que inventa ou reinventa um trajeto da História Universal – do arcaico ao medieval; do moderno ao pós-guerra – e que introduz possibilidades para uma reconquista do corpo no ambiente inumano em que vivemos; ainda que um humano-maquinizado, mas repleto de sentidos.
Leia o texto na integra em :
Texto: Fábio Rocha
Foto: Diego Lisboa
quarta-feira, 15 de abril de 2009
quinta-feira, 9 de abril de 2009
RELATOS 03 - FARPAS RELUZENTES
Com o Sarcófago re-configurado, (des)organizado, seguimos para a segundo dia de filmagem. Adentramos o atelier levando um importante elemento conosco: A máquina de solda.
Jayme é um artista completo, dono de um processo legitimo e peculiar. Na confecção de suas obras encontramos a utilização de uma grande variedade de materiais: Ferro, barro, gesso, madeira, pano, tecidos, alumínio, papel, tinta, suor, couro e pesadelo. A forma peculiar no trato desses elementos, para construir suas indumentárias, instalações e quadros, em minha visão, é o que distancia nosso artista dos demais. Jayme desenvolve uma espécie de alquimia-transcendental-underground onde combina elementos materiais, com sentimentos confusos e abstratos. Essas fórmulas/receitas, sempre apresentam variáveis, resultando em um método de constante mutação artística, impregnado de verdade.
Na ocasião do filme, Jayme já havia sinalizado que estava na fase do ferro, do gesso e do barro. Suas motivações eram as mais variadas para essa decisão. Tinha optado por abandonar o alumínio e a chapa por não querer se tachado na rua de “Homem de Lata” ou “Catador de Latinhas”. A luminosidade do alumínio passou a incomodá-lo e gradativamente os tons ferruginosos do ferro dominaram sua indumentária. Para o Sarcófago, seu atelier, a recente idéia de cobri-lo com azulejo branco para dar maior visibilidade às obras tinha sido abandonada. Jayme agora desejava preencher todo o local com barro e gesso, criando uma espécie de casa de marimbondo, como ele mesmo define.
O Fygura nunca teve uma máquina de solda a sua disposição. Sempre trabalhou com equipamentos emprestados, com curto prazo para devolução. A dificuldade com a disponibilidade do aparelho era uma queixa constante. Animava-me a possibilidade de presenteá-lo com algo tão importante para sua criação. Importante para Jayme e para o filme, pois tínhamos a necessidade de potencializar seu processo de solda.
A figura de Zé Bola nesse dia foi imprescindível. Como nunca tínhamos tido contato com uma maquina de solda, pensávamos que simplesmente a ligaríamos na tomada e pronto. Grande engano. A tomada da máquina eram estranhos dois fios desencapados. Perdemos quase toda a manhã resolvendo essa conexão. Além de ter que adaptar uma tomada na maquina, tínhamos que adaptar a maquina na precária instalação elétrica do atelier de Jayme. Lá vai Hinailto pelo centro da cidade atrás dos materiais elétricos necessários.
Enquanto não resolvíamos a instalação, iniciávamos a resolução de outro problema. Como já falamos aqui, dentro do atelier, na sua solidão, Jayme trabalha a vontade, sem roupa, sem máscara, exposto. Sozinho, não existia o risco de ser observado, desvendado por outrem. Mas, como filmá-lo no interior de seu atelier, trabalhando, sem revelar sua identidade?
Conversando com Jayme tivemos a idéia da construção de uma máscara mais leve, diferente da usada para suas perambulações, uma máscara que não atrapalhasse sua atividade e movimentação no atelier. Estava tudo certo, tínhamos combinado que essa mascara já deveria estar confeccionada para o segundo dia de filmagem. No entanto, percebemos ao chegar no atelier, que Jayme ainda não tinha conseguido iniciá-la. À medida que o filme foi avançando, fomos percebendo que Jayme sempre precisava de um tempo maior do que dizia para criação de seus artefatos. Ele aproveitou nossa dificuldade com a máquina de solta para adiantar a máscara.
Com grande agilidade, Jayme pegou um bolo de arames e um saco com grande quantidade de filtros para ralo de pia. Retorcendo os filtros com pancadas sutis de uma pequena marreta e transando os fios de arame pelos orifícios dos filtros, a magia começou a se instalar no Sarcófago. De imediato sinalizei a equipe para que o registro começasse. Como se estivesse costurando uma colcha de retalhos Jayme habilmente dava forma a sua mascara. Era nítido que não estava muito a vontade com a situação. Sabia que não tinha comprido com o combinado e se apresava para resolver tudo.
Jayme é um artista completo, dono de um processo legitimo e peculiar. Na confecção de suas obras encontramos a utilização de uma grande variedade de materiais: Ferro, barro, gesso, madeira, pano, tecidos, alumínio, papel, tinta, suor, couro e pesadelo. A forma peculiar no trato desses elementos, para construir suas indumentárias, instalações e quadros, em minha visão, é o que distancia nosso artista dos demais. Jayme desenvolve uma espécie de alquimia-transcendental-underground onde combina elementos materiais, com sentimentos confusos e abstratos. Essas fórmulas/receitas, sempre apresentam variáveis, resultando em um método de constante mutação artística, impregnado de verdade.
Na ocasião do filme, Jayme já havia sinalizado que estava na fase do ferro, do gesso e do barro. Suas motivações eram as mais variadas para essa decisão. Tinha optado por abandonar o alumínio e a chapa por não querer se tachado na rua de “Homem de Lata” ou “Catador de Latinhas”. A luminosidade do alumínio passou a incomodá-lo e gradativamente os tons ferruginosos do ferro dominaram sua indumentária. Para o Sarcófago, seu atelier, a recente idéia de cobri-lo com azulejo branco para dar maior visibilidade às obras tinha sido abandonada. Jayme agora desejava preencher todo o local com barro e gesso, criando uma espécie de casa de marimbondo, como ele mesmo define.
O Fygura nunca teve uma máquina de solda a sua disposição. Sempre trabalhou com equipamentos emprestados, com curto prazo para devolução. A dificuldade com a disponibilidade do aparelho era uma queixa constante. Animava-me a possibilidade de presenteá-lo com algo tão importante para sua criação. Importante para Jayme e para o filme, pois tínhamos a necessidade de potencializar seu processo de solda.
A figura de Zé Bola nesse dia foi imprescindível. Como nunca tínhamos tido contato com uma maquina de solda, pensávamos que simplesmente a ligaríamos na tomada e pronto. Grande engano. A tomada da máquina eram estranhos dois fios desencapados. Perdemos quase toda a manhã resolvendo essa conexão. Além de ter que adaptar uma tomada na maquina, tínhamos que adaptar a maquina na precária instalação elétrica do atelier de Jayme. Lá vai Hinailto pelo centro da cidade atrás dos materiais elétricos necessários.
Enquanto não resolvíamos a instalação, iniciávamos a resolução de outro problema. Como já falamos aqui, dentro do atelier, na sua solidão, Jayme trabalha a vontade, sem roupa, sem máscara, exposto. Sozinho, não existia o risco de ser observado, desvendado por outrem. Mas, como filmá-lo no interior de seu atelier, trabalhando, sem revelar sua identidade?
Conversando com Jayme tivemos a idéia da construção de uma máscara mais leve, diferente da usada para suas perambulações, uma máscara que não atrapalhasse sua atividade e movimentação no atelier. Estava tudo certo, tínhamos combinado que essa mascara já deveria estar confeccionada para o segundo dia de filmagem. No entanto, percebemos ao chegar no atelier, que Jayme ainda não tinha conseguido iniciá-la. À medida que o filme foi avançando, fomos percebendo que Jayme sempre precisava de um tempo maior do que dizia para criação de seus artefatos. Ele aproveitou nossa dificuldade com a máquina de solta para adiantar a máscara.
Com grande agilidade, Jayme pegou um bolo de arames e um saco com grande quantidade de filtros para ralo de pia. Retorcendo os filtros com pancadas sutis de uma pequena marreta e transando os fios de arame pelos orifícios dos filtros, a magia começou a se instalar no Sarcófago. De imediato sinalizei a equipe para que o registro começasse. Como se estivesse costurando uma colcha de retalhos Jayme habilmente dava forma a sua mascara. Era nítido que não estava muito a vontade com a situação. Sabia que não tinha comprido com o combinado e se apresava para resolver tudo.
Acertamos que só iríamos filmar suas mãos, e os objetos manipulados. Jayme aceitou, mas se manteve temeroso, tenso. Todo o tempo pedia para não filmar o seu rosto. Por mais que repetíssemos que não estávamos filmando, ele insistia no pedido. De fato, para nós, não existia o menor sentido em filmar seu rosto, apreender sua identidade. A rostidade zero sempre foi o que nos fascinou e motivou no Fygura.
Apesar dos empecilhos, Jayme mantinha uma concentração impassível e a magia da criação. Em menos de duas horas já tinha em mãos uma bela máscara. Falei que ela lembrava algo que não recordo agora e rapidamente ele corrigiu dizendo que era uma cabeça de aranha. Fiquei feliz com o resultado. No mesmo momento Zé Bola terminou a instalação da solda. Já era meio-dia e resolvemos fazer a pausa para o almoço. Jayme decidiu ficar e continuar com o trabalho.
Quando voltamos ao Sarcófago, depois de uma hora, Jayme tinha abandonado o projeto anterior e com a solda em mãos, finalizava a estrutura de outra máscara. Tentei entender os motivos do abandono e percebi que Jayme só estava fazendo a primeira mascara para nos agradar, para termos algo para filmar em quanto a solda não estava pronta. Quando perguntei o que ia fazer com a máscara anterior ele rapidamente a pegou e atirou no lixo. Enquanto estávamos no almoço, já com a máquina em mãos, ele deu inicio ao projeto da forma que desejava. Utilizando ferro e os mesmo filtros, criou uma estrutura mais sólida e robusta.
Com a máquina de solda ligada uma nova configuração de sombra e luz impregnou o ambiente. As fagulhas do eletródo em contato com o ferro pipocavam como cometas luminosos. O som singular da máquina se misturava aos urros e xingamentos de Jayme ao ter a pele corrompida pelos estilhaços incandescentes. Passeávamos pelos corredores estreitos do Sarcófago hipnotizados com a ação. Foram dois dias absortos na confecção da máscara. Cruzamos a primeira sexta 13 do filme envoltos em um clima de fascínio e cansaço. Concentrados, ensimesmados, distraídos, até nos queimarmos no fogo da criação!
Apesar dos empecilhos, Jayme mantinha uma concentração impassível e a magia da criação. Em menos de duas horas já tinha em mãos uma bela máscara. Falei que ela lembrava algo que não recordo agora e rapidamente ele corrigiu dizendo que era uma cabeça de aranha. Fiquei feliz com o resultado. No mesmo momento Zé Bola terminou a instalação da solda. Já era meio-dia e resolvemos fazer a pausa para o almoço. Jayme decidiu ficar e continuar com o trabalho.
Quando voltamos ao Sarcófago, depois de uma hora, Jayme tinha abandonado o projeto anterior e com a solda em mãos, finalizava a estrutura de outra máscara. Tentei entender os motivos do abandono e percebi que Jayme só estava fazendo a primeira mascara para nos agradar, para termos algo para filmar em quanto a solda não estava pronta. Quando perguntei o que ia fazer com a máscara anterior ele rapidamente a pegou e atirou no lixo. Enquanto estávamos no almoço, já com a máquina em mãos, ele deu inicio ao projeto da forma que desejava. Utilizando ferro e os mesmo filtros, criou uma estrutura mais sólida e robusta.
Com a máquina de solda ligada uma nova configuração de sombra e luz impregnou o ambiente. As fagulhas do eletródo em contato com o ferro pipocavam como cometas luminosos. O som singular da máquina se misturava aos urros e xingamentos de Jayme ao ter a pele corrompida pelos estilhaços incandescentes. Passeávamos pelos corredores estreitos do Sarcófago hipnotizados com a ação. Foram dois dias absortos na confecção da máscara. Cruzamos a primeira sexta 13 do filme envoltos em um clima de fascínio e cansaço. Concentrados, ensimesmados, distraídos, até nos queimarmos no fogo da criação!
Texto - Daniel Lisboa
Fotos - João Ramos
segunda-feira, 30 de março de 2009
quarta-feira, 25 de março de 2009
A DESCOLONOMIA E O PÉ COMO ORIGEM DAS DESGRAÇAS
"O detalhe é ornamento que se traduz em puro signo, que produz sentido (...), que é enfeite, metáfora do cordão umbilical de nossa ancestralidade. Enfeitiça, é poder, sedução, poderes inabarcáveis, não totalmente normatizáveis. Seu poder reside justamente no que não diz, no que esconde, no que não suporta análise."
Eliane Chagas
Basta olhar para os pés de JAYME para perceber a origem de suas desgraças...quer dizer...para um entendimento das desgraças de um andarilho em sua cotidiana DESCOLONOMIA...expliquemos melhor...uma das poucas coisas que podemos ver quando olhamos para esse neotuaregue da cidade e o seu processo de andar, perambular, deixar de ser, mudar sem sair do lugar...num movimento, digamos, de des-desgraçar a vida...é o seu PÉ...vamos por parte...historicamente o nomadismo na economia recolectora era motivado pela deslocação das populações na procura constante de alimentos...hoje o sedentarismo e as manicures se completam...pedra pome...alicates...esmaltes...e pés finos...isos...demonstração da subjetividade vindo de baixo...no caso do FYGURA...não há pedra pome e alicate que dê jeito na queratina adquirida em suas andanças...tamanha a movimentação Descolectora – neologismo que designa um novo aspecto do nomadismo: descolar as coisas – o pé e a descolonomia...nesse sentido estão intimamente ligados...são causa e efeito...o pé rachado da desgraça social e uma pseudociência nômade de espaço impreciso se complementam...onde espaço, tempo, velocidade, política, economia simbólica, acidente, percurso, fome, ternura, se perpendicularizam...e quid facti...é daí que podemos apreender a – a quem interessar possa – a radical transfiguração da carapaça do artista e a frágil competência dromológica das instituições políticas herdadas da modernidade quase o assunto é processo civilizatório...ainda não está claro...nos esforcemos um pouco mais...adentrar no campo da Transpolítica...naquilo que chamei por acaso de CINEMADOLOGIA (método de fazer cinema caminhando....e caminhar nas imagens-movimento sem sair do lugar) podemos dizer que ao perceber recortar o pé de JAYME...logo utilizamos as interações para capturar e devolver ao organismo social um deslocamento (descolamento) autêntico, singular, e mais que isso, verdadeiramente desgraçado pelo espaço-tempo da nossa transhistoricidade...bem que o FYGURA poderia ter desenvolvido com seu talento de ferreiro...uma espécie de Homeless Vehicle...aquele projeto do designer Krzysztof Wodiczko...carrinho construído com placas de alumínio, barras e grades de aço, e plexiglass....só que JAYME não é um homeless...sua casa é o mundo....e seu mundo é uma grande oca de resistência...além do que as “suas coisas” é a única coisa que importa...e com razão porque o seu estranhamento é único...o estranhamento aumenta quando alguns moradores de rua tentam se identificar com os farrapos...as farpas...e não conseguem mais que atestar uma diferença fundamental de vontade...o estranhamento aumenta quando um burguês quer tirar uma foto ao lado de um mutante para recompor a sua imprecisão e não consegue nada mais que uma discrepância...seu estranhamento aumenta quando a rostidade zero acaba por provocar uma irritação da identidade e uma contraviolência de espelho e isso é nada mais que um atestado de que o medo tem um rosto...seu estranhamento é maior quando nos seus abafanéticos passos...a discussão acerca das diferenças cai feito Faetonte...quando se percebe a intolerância...pedradas...xingamentos...insultos que revelam de mais a mais a hipocrisia dessa pseudo democracia do igual...é preciso dizer...em salvador ninguém tolera o diferente...e a maledicências que é um dos elementos mais forte dessa nossa “identidade” nada mais é do que a incapacidade de aceitar a enesidade das cosgomonias...para os neófitos explico melhor....a incapacidade de aceitar a diversidade de visões de mundo...rejeitar o outro é não aceitar a si mesmo como diferença...a repetição do mesmo é sobremaneira uma incapacidade de se trasubstanciar...de se despersonalizar no outro...de um modo claro...e posso dizer isso com convicção porque sempre fiz isso...meu revide era “falar mal” daquele que não aceitava o mal....a transgressão...o torto...o monstruoso...o mórbido...o underground...a transvaloração...o alternativo...e isso já é uma primeira imagem desse ambiente – daqui ninguém sai vivo – e que nas perambulações do monstro urbano logo fica patente essa outra maledicência...que chamo de falsa maledicência...que é a incapacidade de identificar procedimentos diferenciados misturado com uma pitada de inveja da sua própria incapacidade de ser diferente...somado ao “mal pelo mal”...o espírito de rebanha mal-educado para a concretude da disjunção...citemos um exemplo para concretizar ainda mais isso que cotidianamente se dá com o FYGURA...um misto de intolerância com fascismo...ódio com mediocridade...ingratidão com soberba...citarei o exemplo do cinema onde a fogueira é grande e a luta pelos espaços de saber-poder são incansáveis e tortuosos...como se fosse mesmo possível destruir um processo singular...ou simplesmente deslegitimá-lo...este por exemplo de O SARCÓFAGO...ouvi nas alcovas...ou melhor em conversa fiada...em falácias de dispersão e falcatruas de disceptação...desses sensores do disse-me-disse (e isso aqui é apenas uma análise discursiva...eu me complemento dessas fissuras) que esse filme não daria certo da maneira que foi pensado, iluminado e gestado....como não?
Para ler o texto na integra acesse:
Texto: Fábio Rocha
Foto: João Ramos
quarta-feira, 18 de março de 2009
AUDIOVISUALIZAÇÕES - TV ARATU
Assista matéria da TV ARATU sobre "O Sarcófago":
http://www.aratuonline.com.br/2009/videos/1543,jayme-figura-e-tema-de-filme-de-daniel-lisboa.html
http://www.aratuonline.com.br/2009/videos/1543,jayme-figura-e-tema-de-filme-de-daniel-lisboa.html
terça-feira, 17 de março de 2009
VISITAÇÃO CONCLUIDA
Chegamos ao fim da segunda etapa do nosso filme. Com o show “O Sarcófago”, fechamos a fase de produção, captação, filmagem. Depois de atravessar duas sextas-feiras 13 no nosso cronograma e uma boa quantidade de empecilhos intra e extra-filme, todos sobreviveram. Claro que bastante moídos e carcomidos.
O desafio de registrar Jayme e seu Sarcófago durante um mês foi uma experiência fantástica e inesquecível. A quantidade de historias e experiências acumuladas durante essa aventura imagética, certamente serão carregadas por cada membro da equipe para sempre. Tenho certeza que até o próprio Jayme foi tocado e modificado por esse fluxo. Aproveito para agradecer a toda equipe e todos os nossos apoiadores que tornaram possível essa etapa. (Berimbau Filmes, FACS, Restaurante RAMA, Pelourinho Cultural, Joel Almeida, Estrada Perdida)
Agora é concentrar na montagem e finalização dos sons e imagens capturadas.
O blog não vai ser abandonado, muito pelo contrario, vou me esforçar para lembrar cada dia de filmagem e continuar atualizando meus RELATOS. Além deles as sessões MUTAÇÕES, com as fotos antigas de Jayme, FARPAS, com seus escritos e desenhos e AUDIOVISUALIZAÇÕES com imagens do making of e trechos do filme, continuarão sendo atualizadas. Além é claro das colaborações textuais de Fábio Rocha.
Por tudo isso, convido vocês a continuarem curtindo a morbidez do nosso Sarcófago.
O desafio de registrar Jayme e seu Sarcófago durante um mês foi uma experiência fantástica e inesquecível. A quantidade de historias e experiências acumuladas durante essa aventura imagética, certamente serão carregadas por cada membro da equipe para sempre. Tenho certeza que até o próprio Jayme foi tocado e modificado por esse fluxo. Aproveito para agradecer a toda equipe e todos os nossos apoiadores que tornaram possível essa etapa. (Berimbau Filmes, FACS, Restaurante RAMA, Pelourinho Cultural, Joel Almeida, Estrada Perdida)
Agora é concentrar na montagem e finalização dos sons e imagens capturadas.
O blog não vai ser abandonado, muito pelo contrario, vou me esforçar para lembrar cada dia de filmagem e continuar atualizando meus RELATOS. Além deles as sessões MUTAÇÕES, com as fotos antigas de Jayme, FARPAS, com seus escritos e desenhos e AUDIOVISUALIZAÇÕES com imagens do making of e trechos do filme, continuarão sendo atualizadas. Além é claro das colaborações textuais de Fábio Rocha.
Por tudo isso, convido vocês a continuarem curtindo a morbidez do nosso Sarcófago.
Daniel Lisboa
segunda-feira, 9 de março de 2009
A EXPLOSIÇÃO VAI ACONTECER - IMPERDÍVEL
Sexta-feira 13, Pelourinho, Centro Histórico de Salvador, Patrimônio Cultural da Humanidade. Para celebrar a construção de sua obra maior, “O Sarcófago”, Jayme Fygura, há 10 anos afastado dos palcos, apresenta sua obra musical, acompanhado pela banda underground “Estrada Perdida”. Vestido com sua nova indumentária (armadura), Jayme executará uma performance mórbida e explosiva, que será registrada pelas lentes do diretor Daniel Lisboa para o filme “O Sarcófago”, premiado no edital de curta do Ministério da Cultura.
RELATOS 02 - RECICLAGEM ESPIRITUAL
Muro levantado, Sarcófago devidamente iluminado. O novo desafio era o que até então denominávamos: “A Limpeza do Sarcófago”, exigida por Jayme para que começássemos a filmar seu atelier. Logo pensei: Como Jayme vai limpar aquele universo caótico? O que é lixo e o que não é lixo ali? Bom, decidi independente de qualquer coisa, filmar tudo. Esse seria nosso primeiro dia de filmagem, o primeiro e o mais complicado. A limpeza estava recheada de exigências: Jayme não poderia sair do atelier carregando o lixo e jogá-lo na carreta, ele estava extremamente tenso com o processo de limpeza. Não queria de forma nenhuma que os vizinhos observassem o andamento das coisas, analisassem que tipo de entulho estava saindo do Sarcófago. Eles jamais compreenderiam o processo.
Jayme fazia questão que tudo acontecesse às cinco da madrugada e que a carreta parasse colada em sua porta, assim não precisaria sair do atelier, poderia arremessar os sacos e objetos diretamente na caçamba. Outra exigência era a compra de uma super mascara com cilindro de oxigênio. Existe um lugar no Sarcófago, uma espécie de chaminé, que segundo Jayme, mora um enorme rato, esse rato vêm soltando pêlos no interior dessa estrutura há séculos e se qualquer pessoa respirar essa poeira/secular, fatalmente adoeceria. Pensamos: massa, vamos comprar para toda equipe então. O problema é que a tal mascara custava um pouco acima do que imaginávamos. Principalmente para um filme de baixo orçamento como o nosso. Então, apesar dos protestos de Fábio, decidimos comprar a de Jayme e nos arriscarmos com nossos filtros mesmo.
Beleza, vamos nessa então, como a rua de Jayme é muito estreita, tivemos que armar uma logística danada com cones para que nossa carreta, parada no lado oposto ao de estacionar, não bloqueasse todo o tráfego da Ladeira do Carmo. Inailton conseguiu alguns cones com o Sargento que estava fazendo nossa segurança, pegou mais um com o próprio Jayme e ficou tudo certo.
Com o som também já estava tudo acertado. Um dia antes tínhamos visitado o Sarcófago com Napoleão e Weider, nossos técnicos de som. Segundo Napa, nós tínhamos descrevido o Sarcófago, em termos sonoros, um pouco pior que a realidade, porém, continuava bastante assustador. Logo foi diagnosticado que o sistema de ventilação de Jayme não caminharia muito bem com a captação de som direto. Após alguns minutos de explicação convencemos Jayme a desligá-lo durante a filmagem. No entanto, ao desligá-lo para um teste, percebemos que os sons da rua eram tão invasivos quanto ele. Jayme sabiamente se manifestou: - Ele foi construído exatamente para reprimir o som dos tambores! Refletimos um pouco entre optar pelos tambores ou pela turbina. Para nossa infelicidade corporal, o turbo/ventilador foi derrotado.
Pois bem, voltemos à filmagem, começamos com um certo atraso, a carreta só chegou as 6h. Subimos a pequena calçada, abrimos a lateral da caçamba e Jayme devidamente mascarado, iniciou o ritual de limpeza. Ou melhor, ritual de mudança. Nesse momento já tínhamos sido informados pelo próprio Jayme que não se tratava de uma limpeza, e que o que ele estava tirando do Sarcófago não era lixo, e sim matéria prima, reciclada durante anos em seu atelier. O que ele desejava agora era realizar a mudança dessa matéria, um remanejamento, sem destino, sem rumo, mas consciente que de alguma forma esses objetos voltariam para o seu Sarcófago. Pronto, depois de algumas broncas, ficou tudo entendido.
Definimos que dentro do Sarcófago com Jayme só ficaria eu e Fábio (Diretor de Fotografia). Igor (assistente de Fotografia) faria entradas pontuais para descarregar os cartões e dar apoio a Fábio. Somente nós três estávamos vestidos adequadamente para o Sarcófago. Do lado de fora Inailton (produtor de Campo), Carol e Eliana (Produtoras de Base), Napoleão e Weider (Som), que antes de tudo já tinham lapelado Jayme e o atelier, Zé Bola(Eletricista), Cristiano (motorista) e o Sargento, que segundo Inailton é o dono do Pelourinho. No decorrer do dia percebemos que ele não estava mentindo. Hum! Já estava esquecendo Mauricio, motorista da carreta de frete, figura importante também no dia.
Jayme parecia incorporado. Apesar de termos dado instruções para ele falar enquanto trabalhava, a única coisa ouvida nesse dia foram xingamentos, gritos e urros. Como um mecanismo acionado o Fygura percorria os corredores do Sarcófago com os braços cheios de entulhos. Se batendo nas paredes, empresando, arrancando, mutilando. Havia momentos em que parecia que Jayme esquecia que era humano, que carrega um corpo, com pele, ossos e sangue. Desgraça!!! Revirando aqueles objetos Jayme parecia estar estripando as suas próprias entranhas. As idas e vindas levantavam uma nuvem de poeira. A fedentina se instalou. Tentávamos nos posicionar à procura do plano perfeito, sem atrapalhar sua movimentação. Para permanecer ali se fazia necessário adentrar na energia de Jayme, acompanhar seu transe, e seguir em ritual. A caçamba enchia cada vez mais. Em alguns momentos tive que passar do Sarcófago para a caçamba para organizar os entulhos na carroceria. Esse processo se estendeu por horas. Muito mais do que as 2h que nós e Jayme imaginávamos. A montanha de entulho não parava de crescer. Mauricio, o dono da carreta, parecia não acreditar no que estava acontecendo, tinha sido chamado para um simples frete e estava ali, diante das entranhas de um Sarcófago. A tal mudança acabou por virar um acontecimento no Pelourinho.
Jayme fazia questão que tudo acontecesse às cinco da madrugada e que a carreta parasse colada em sua porta, assim não precisaria sair do atelier, poderia arremessar os sacos e objetos diretamente na caçamba. Outra exigência era a compra de uma super mascara com cilindro de oxigênio. Existe um lugar no Sarcófago, uma espécie de chaminé, que segundo Jayme, mora um enorme rato, esse rato vêm soltando pêlos no interior dessa estrutura há séculos e se qualquer pessoa respirar essa poeira/secular, fatalmente adoeceria. Pensamos: massa, vamos comprar para toda equipe então. O problema é que a tal mascara custava um pouco acima do que imaginávamos. Principalmente para um filme de baixo orçamento como o nosso. Então, apesar dos protestos de Fábio, decidimos comprar a de Jayme e nos arriscarmos com nossos filtros mesmo.
Beleza, vamos nessa então, como a rua de Jayme é muito estreita, tivemos que armar uma logística danada com cones para que nossa carreta, parada no lado oposto ao de estacionar, não bloqueasse todo o tráfego da Ladeira do Carmo. Inailton conseguiu alguns cones com o Sargento que estava fazendo nossa segurança, pegou mais um com o próprio Jayme e ficou tudo certo.
Com o som também já estava tudo acertado. Um dia antes tínhamos visitado o Sarcófago com Napoleão e Weider, nossos técnicos de som. Segundo Napa, nós tínhamos descrevido o Sarcófago, em termos sonoros, um pouco pior que a realidade, porém, continuava bastante assustador. Logo foi diagnosticado que o sistema de ventilação de Jayme não caminharia muito bem com a captação de som direto. Após alguns minutos de explicação convencemos Jayme a desligá-lo durante a filmagem. No entanto, ao desligá-lo para um teste, percebemos que os sons da rua eram tão invasivos quanto ele. Jayme sabiamente se manifestou: - Ele foi construído exatamente para reprimir o som dos tambores! Refletimos um pouco entre optar pelos tambores ou pela turbina. Para nossa infelicidade corporal, o turbo/ventilador foi derrotado.
Pois bem, voltemos à filmagem, começamos com um certo atraso, a carreta só chegou as 6h. Subimos a pequena calçada, abrimos a lateral da caçamba e Jayme devidamente mascarado, iniciou o ritual de limpeza. Ou melhor, ritual de mudança. Nesse momento já tínhamos sido informados pelo próprio Jayme que não se tratava de uma limpeza, e que o que ele estava tirando do Sarcófago não era lixo, e sim matéria prima, reciclada durante anos em seu atelier. O que ele desejava agora era realizar a mudança dessa matéria, um remanejamento, sem destino, sem rumo, mas consciente que de alguma forma esses objetos voltariam para o seu Sarcófago. Pronto, depois de algumas broncas, ficou tudo entendido.
Definimos que dentro do Sarcófago com Jayme só ficaria eu e Fábio (Diretor de Fotografia). Igor (assistente de Fotografia) faria entradas pontuais para descarregar os cartões e dar apoio a Fábio. Somente nós três estávamos vestidos adequadamente para o Sarcófago. Do lado de fora Inailton (produtor de Campo), Carol e Eliana (Produtoras de Base), Napoleão e Weider (Som), que antes de tudo já tinham lapelado Jayme e o atelier, Zé Bola(Eletricista), Cristiano (motorista) e o Sargento, que segundo Inailton é o dono do Pelourinho. No decorrer do dia percebemos que ele não estava mentindo. Hum! Já estava esquecendo Mauricio, motorista da carreta de frete, figura importante também no dia.
Jayme parecia incorporado. Apesar de termos dado instruções para ele falar enquanto trabalhava, a única coisa ouvida nesse dia foram xingamentos, gritos e urros. Como um mecanismo acionado o Fygura percorria os corredores do Sarcófago com os braços cheios de entulhos. Se batendo nas paredes, empresando, arrancando, mutilando. Havia momentos em que parecia que Jayme esquecia que era humano, que carrega um corpo, com pele, ossos e sangue. Desgraça!!! Revirando aqueles objetos Jayme parecia estar estripando as suas próprias entranhas. As idas e vindas levantavam uma nuvem de poeira. A fedentina se instalou. Tentávamos nos posicionar à procura do plano perfeito, sem atrapalhar sua movimentação. Para permanecer ali se fazia necessário adentrar na energia de Jayme, acompanhar seu transe, e seguir em ritual. A caçamba enchia cada vez mais. Em alguns momentos tive que passar do Sarcófago para a caçamba para organizar os entulhos na carroceria. Esse processo se estendeu por horas. Muito mais do que as 2h que nós e Jayme imaginávamos. A montanha de entulho não parava de crescer. Mauricio, o dono da carreta, parecia não acreditar no que estava acontecendo, tinha sido chamado para um simples frete e estava ali, diante das entranhas de um Sarcófago. A tal mudança acabou por virar um acontecimento no Pelourinho.
Diferente da descrição exigida por Jayme, os vizinhos e os transeunte acabaram virando espectadores do processo. O Gari que subia a rua perguntou: Jayme está se mudando? O bêbado boquiaberto: Ele Morreu? A velha vizinha do andar de cima cantarolou: Até que em fim, até que em fim! Impávido, protegido por sua mascara, Jayme prosseguiu durante horas. Para mim, ao ver a carreta subindo a ladeira, ficou difícil de entender de onde Jayme tirou todo aquele volume. No final, ao entrar novamente no Sarcófago, ele parecia o mesmo, intacto, como se nada tivesse saído dali. Somente imagens e sons maravilhosos.
Texto: Daniel Lisboa
Foto: João Ramos
quarta-feira, 4 de março de 2009
terça-feira, 3 de março de 2009
O FORA E O DENTRO DO CORPO-OBRA
“Outrem é quem fabrica os corpos com os elementos, os objetos com os corpos, assim como fabrica seu próprio semblante, com os mundos que exprime.” Michel Tournier
; quando vi JAYME pela primeira vez eu não podia ver seu rosto, mas eu tinha certeza, que ali dentro havia uma expressão de êxtase...a perspectiva de ver sem ser visto....uma espécie de antipanoptismo (O olho que tudo vê...sem ser visto) estava instaurada..o homem convertido em obra...a obra convertida em signo...mas - enquanto tal - é pura exterioridade...e na hipertrofia da imagem sobra o efeito de véu de ferro...um homem nú...exposto fora da galeria...trinta anos dentro de uma segunda pele...era sobretudo uma revolta e mais que isso um revide (pré)histórico...um desejo anárquico contra os valores instituídos...uma resistente inadequação-inquietude dos esquemas formais da arte contemporânea...e ainda assim...um outro espaço gestado para a arte na contemporaneidade...o fora-íntimo...a corporeidade a céu aberto...uma guerra entre o "dentro" e "fora"...no limiar, expressava o paradoxo do ser...ser dentro...ser de dentro...sedento por um fora...era o Sujeito-objeto dissipado ao sabor dos ventos no cotidiano artístico modelizado...Quando vi essa FYGURA pela primeira vez nos idos dos anos 80 (e nessa época...é preciso dizer...não entendia os paradigmas e os contra-modelos de inspiração ético-estética) me assustei...hoje percebo que para ser um artista é preciso se fazer um corpo...um corpo que extrapole o organismo...um corpo experimentando as intensidades de uma reinvenção vital...uma forma-conceito singular de subjetivação...um outrem aberto para mundos (im)possíveis...uma anti-estrutura do campo perceptivo-sensitivo..um não-abstrato real...um corpo presentificado performaticamente...construído-desconstruído nos laboratórios de uma UZYNA-MÁQUINA DE GUERRA...um corpo- arte estranho...uma aparência oposta e contrária ao mundo das aparências...com o qual sempre esteve (problematicamente) (des)ligado...seu ritual é de anti-produção...acordar perifericamente, levantar obra, andar para o centro, pensar o trajeto, escrever uma poética, correr atrás do “combustível’...produzir um corpo...continuar obra...entregar-se ao fascínio da ausência de tempo (é impossível saber a idade de uma máquina)...fora do relógio, dentro da ausência...uma crise da arte extensiva a todo o espaço cultural...aí começa a inevitável pergunta: isto é arte? Não...a arte é que é isto!... “Entre a fome, a miséria, a guerra e a do , eu acho as minhas próprias razões...o espírito expõe seus sentimentos buscando no escuro um pouco de luz...com molduras de farpas reluzentes...o espírito expõe a dor do amor a arte”...é dessa experiência que extraímos uma imagem-movimento...uma imagem para além da imagem...uma engrenagem livre... corpo-escrita...sobre o qual a morte desenha os contornos da sua permanência...a transgressão desse ser-evento é o que serve de magnetismo para o cinema-olho...é o que nos atrai e o diferencia dos demais artistas...quando abandona o bom senso e o senso comum...ele acaba por “olhar para fora com um grande olhar animal...” e isso só ele pode ver...os olhos mudam de direção e essa viagem é o outro lado...e o outro lado é o acontecimental de não viver desviando...mas direcionado para dentro...JAYME é uma ilimitada periferia (des)centralizada...um cérebro que é uma cidade...uma cidade-cérebro melhor dizendo...um ninho de ratos...um subterrâneo de formigas e aranhas...um enxame de abelhas...uma multiplicidade incontrolável em que se encontra um outra ordem...não mais a do homem e a do Estado...uma multiplicidade do FORA-DENTRO...a sede da infinita proliferação disjuntiva...travessia cósmica...uma arquitetura labiríntica...paleta sensorial da sobre(super)vivência do tumulto de um mundo anômalo e feroz...a morte-vida sempre o acompanhou diante da ambição do semelhante....e esse espírito dominado pelo primitivo...de uma perseverança que tateia as inconstâncias da miséria...de uma vontade traduzida em angústia da pobreza...é também um abandono ao fora das impotências sociais...é também o dentro onde a consciência cessa de ser consciência ...universo móvel-fixo...energia cósmica e libidinal...placas imperturbáveis de idéias-práxis...engenharia rígida...cérebro-patrimônio-corpo-histórico da humanidade...corpo-tumba que passa por palácios, fábricas, asilos, escolas, siderúrgicas, cemitério, feiras, sanatórios, prisões, por vermes, vizinhos, por agressões físicas...e depois de ter passado pelo exército...e por uma gráfica...acaba por chegar a um espaço-tempo puramente afirmativo: o seu movimento pelas margens...o seu mergulho no infinito do impensado...a sua navegação nas ondas do devir...a sua dobragem ao limiar da potência...certamente o torna um instrumento vibrátil...no qual a vida é sempre uma eterna e infinda invenção...de início um sentido manifestamente liberatório da arte, um íntimo informalizável...por fim...um non-sense vanguardista...carregando os traços das lutas populares centenárias num único corpo...essa é a lógica dos seus sentidos...é ele próprio uma luta dentro-fora dos mercados simbólicos...concentrado, imperturbável... uma pele em carne viva...uma vida em pele de ferro...o sangue escorrendo sem ser visto...as veias abertas de uma América latrina...cheia de merdas e expressões bizarras que são repetidamente vociferadas na oralidade maquínica do obra-diferença...donde a ação desafiadora dessa performance de três décadas...suas mutações anorgânicas...é nada mais que um rosto fora de cena, de lugar, de sentido...rostidade zero...na mais contraditória das imagens...jorrando no seu campo de batalha...flores e armas de uma tragédia transformada em obra de arte...ao tempo em que é um adeus às obras primas...uma adeus a galeria...uma adeus...às Belas Artes...esse é o seu artifício...uma obra paripatética...isto é, um ARTEfício que perambula...pés-tanque de guerra e paz...por meio do qual enfrenta a morte cotidiana...por isso a angústia é necessária para os seus procedimentos...para o seu plano de composição...sem ela, morrer seria fácil...e é justamente da tragicidade que nasce o êxtase...assim como todo objeto de êxtase é criado pela por esses artifícios...a experiência desse artista-obra é uma experiência de morte...o terror, o sofrimento, a morbidez...dita de dentro para fora..THEMORB..é o que assegura a sua paz(ciência) laboriosa...o seu sacrifício visa o sagrado...É uma forma de experiência com o sagrado...com o “espírito”...sob a tortura do peso das farpas...ele parece sempre extasiado...explodindo, excedendo os muros de sua volumetria paradoxal...a cada passo fora de seu lugar interior...aguça ao extremo o problema de nossas próprias dimensões do dentro...e na intimidade...sempre gargalha alto...uma risada como quem diz: “aqui dentro eu estou vivo... lá fora é só a morte”...hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi!!!
; quando vi JAYME pela primeira vez eu não podia ver seu rosto, mas eu tinha certeza, que ali dentro havia uma expressão de êxtase...a perspectiva de ver sem ser visto....uma espécie de antipanoptismo (O olho que tudo vê...sem ser visto) estava instaurada..o homem convertido em obra...a obra convertida em signo...mas - enquanto tal - é pura exterioridade...e na hipertrofia da imagem sobra o efeito de véu de ferro...um homem nú...exposto fora da galeria...trinta anos dentro de uma segunda pele...era sobretudo uma revolta e mais que isso um revide (pré)histórico...um desejo anárquico contra os valores instituídos...uma resistente inadequação-inquietude dos esquemas formais da arte contemporânea...e ainda assim...um outro espaço gestado para a arte na contemporaneidade...o fora-íntimo...a corporeidade a céu aberto...uma guerra entre o "dentro" e "fora"...no limiar, expressava o paradoxo do ser...ser dentro...ser de dentro...sedento por um fora...era o Sujeito-objeto dissipado ao sabor dos ventos no cotidiano artístico modelizado...Quando vi essa FYGURA pela primeira vez nos idos dos anos 80 (e nessa época...é preciso dizer...não entendia os paradigmas e os contra-modelos de inspiração ético-estética) me assustei...hoje percebo que para ser um artista é preciso se fazer um corpo...um corpo que extrapole o organismo...um corpo experimentando as intensidades de uma reinvenção vital...uma forma-conceito singular de subjetivação...um outrem aberto para mundos (im)possíveis...uma anti-estrutura do campo perceptivo-sensitivo..um não-abstrato real...um corpo presentificado performaticamente...construído-desconstruído nos laboratórios de uma UZYNA-MÁQUINA DE GUERRA...um corpo- arte estranho...uma aparência oposta e contrária ao mundo das aparências...com o qual sempre esteve (problematicamente) (des)ligado...seu ritual é de anti-produção...acordar perifericamente, levantar obra, andar para o centro, pensar o trajeto, escrever uma poética, correr atrás do “combustível’...produzir um corpo...continuar obra...entregar-se ao fascínio da ausência de tempo (é impossível saber a idade de uma máquina)...fora do relógio, dentro da ausência...uma crise da arte extensiva a todo o espaço cultural...aí começa a inevitável pergunta: isto é arte? Não...a arte é que é isto!... “Entre a fome, a miséria, a guerra e a do , eu acho as minhas próprias razões...o espírito expõe seus sentimentos buscando no escuro um pouco de luz...com molduras de farpas reluzentes...o espírito expõe a dor do amor a arte”...é dessa experiência que extraímos uma imagem-movimento...uma imagem para além da imagem...uma engrenagem livre... corpo-escrita...sobre o qual a morte desenha os contornos da sua permanência...a transgressão desse ser-evento é o que serve de magnetismo para o cinema-olho...é o que nos atrai e o diferencia dos demais artistas...quando abandona o bom senso e o senso comum...ele acaba por “olhar para fora com um grande olhar animal...” e isso só ele pode ver...os olhos mudam de direção e essa viagem é o outro lado...e o outro lado é o acontecimental de não viver desviando...mas direcionado para dentro...JAYME é uma ilimitada periferia (des)centralizada...um cérebro que é uma cidade...uma cidade-cérebro melhor dizendo...um ninho de ratos...um subterrâneo de formigas e aranhas...um enxame de abelhas...uma multiplicidade incontrolável em que se encontra um outra ordem...não mais a do homem e a do Estado...uma multiplicidade do FORA-DENTRO...a sede da infinita proliferação disjuntiva...travessia cósmica...uma arquitetura labiríntica...paleta sensorial da sobre(super)vivência do tumulto de um mundo anômalo e feroz...a morte-vida sempre o acompanhou diante da ambição do semelhante....e esse espírito dominado pelo primitivo...de uma perseverança que tateia as inconstâncias da miséria...de uma vontade traduzida em angústia da pobreza...é também um abandono ao fora das impotências sociais...é também o dentro onde a consciência cessa de ser consciência ...universo móvel-fixo...energia cósmica e libidinal...placas imperturbáveis de idéias-práxis...engenharia rígida...cérebro-patrimônio-corpo-histórico da humanidade...corpo-tumba que passa por palácios, fábricas, asilos, escolas, siderúrgicas, cemitério, feiras, sanatórios, prisões, por vermes, vizinhos, por agressões físicas...e depois de ter passado pelo exército...e por uma gráfica...acaba por chegar a um espaço-tempo puramente afirmativo: o seu movimento pelas margens...o seu mergulho no infinito do impensado...a sua navegação nas ondas do devir...a sua dobragem ao limiar da potência...certamente o torna um instrumento vibrátil...no qual a vida é sempre uma eterna e infinda invenção...de início um sentido manifestamente liberatório da arte, um íntimo informalizável...por fim...um non-sense vanguardista...carregando os traços das lutas populares centenárias num único corpo...essa é a lógica dos seus sentidos...é ele próprio uma luta dentro-fora dos mercados simbólicos...concentrado, imperturbável... uma pele em carne viva...uma vida em pele de ferro...o sangue escorrendo sem ser visto...as veias abertas de uma América latrina...cheia de merdas e expressões bizarras que são repetidamente vociferadas na oralidade maquínica do obra-diferença...donde a ação desafiadora dessa performance de três décadas...suas mutações anorgânicas...é nada mais que um rosto fora de cena, de lugar, de sentido...rostidade zero...na mais contraditória das imagens...jorrando no seu campo de batalha...flores e armas de uma tragédia transformada em obra de arte...ao tempo em que é um adeus às obras primas...uma adeus a galeria...uma adeus...às Belas Artes...esse é o seu artifício...uma obra paripatética...isto é, um ARTEfício que perambula...pés-tanque de guerra e paz...por meio do qual enfrenta a morte cotidiana...por isso a angústia é necessária para os seus procedimentos...para o seu plano de composição...sem ela, morrer seria fácil...e é justamente da tragicidade que nasce o êxtase...assim como todo objeto de êxtase é criado pela por esses artifícios...a experiência desse artista-obra é uma experiência de morte...o terror, o sofrimento, a morbidez...dita de dentro para fora..THEMORB..é o que assegura a sua paz(ciência) laboriosa...o seu sacrifício visa o sagrado...É uma forma de experiência com o sagrado...com o “espírito”...sob a tortura do peso das farpas...ele parece sempre extasiado...explodindo, excedendo os muros de sua volumetria paradoxal...a cada passo fora de seu lugar interior...aguça ao extremo o problema de nossas próprias dimensões do dentro...e na intimidade...sempre gargalha alto...uma risada como quem diz: “aqui dentro eu estou vivo... lá fora é só a morte”...hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi hi!!!
Texto: Fábio Rocha
Fotos: Inailton Pinheiro
Fotos: Inailton Pinheiro
sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009
RELATOS 01 - O MURO E O BOCAL
Como em todo relacionamento que envolve entidades, seja na umbanda, no candomblé ou no hinduísmo, a necessidade de oferendas é fundamental para um bom proceder. No nosso caso não poderia ser diferente.
A primeira tarefa/oferenda indicada por Jayme foi a construção de um muro dentro do seu atelier. Uma de suas paredes tinha um recuo, um espaço quadrado, que dava para baixo da escada dos vizinhos. Segundo Jayme, e depois constatamos que era verdade, todo o som gerado no atelier/sarcófago poderia ser escutado pelos vizinhos. Longe de ser uma paranóia. Pelo que pudemos conhecer dos vizinhos de Jayme, Dona Florinda perde. Isso é um fato. Nenhum dos outros moradores do casarão gostam da presença dele. Acreditam plenamente que todos os ratos e baratas do Pelô saem da casa de Jayme. Antes do muro, uma das formas inventadas por Jayme para combater a bisbilhotagem da vizinhança, foi sintonizar uma freqüência extremamente aguda de rádio que ressoava 24h por dia. E ainda de quebra, segundo o mesmo, espantava os insetos de seu atelier. Para Jayme uma medida extremamente útil, para nós, um imenso problema pois, como iríamos captar o som direto? Melhor subir o muro!
Não tínhamos plano de filmar o processo do muro. Então enviamos 150 blocos e um saco de cimento para o Sarcófago. Jayme tinha pedido 300 blocos, mas fiz meus cálculos virtuais na parede dele e achei que seria de mais. Mais tarde vi que estava certo.
O segundo passo antes das filmagens era a iluminação do Sarcófago. Esse foi um ponto bastante discutido entre a equipe. Eu, Fábio (diretor de fotografia) e Tenille (Produtora Executiva) quebramos a cabeça pensando na maneira ideal para iluminar o iluminável. Bom, nas minhas primeiras idas ao Sarcofago, ele era praticamente um breu, uma luz fraca, velas e uma TV desintonizada. Para o olho humano e para a PD-150 da época a luz ficou fantástica. Foi na época do Projeto Figuraça. Já se vão 4 anos. Hoje o atelier está alguns milímetros mais arejado, iluminado por uma única lâmpada de 500, que acaba não alcançando os becos e cantos do Sarcófago.
Bem, aquela iluminação quente, obscura, da época da minha primeira visita não saia da minha cabeça. Queria de alguma forma manter aquele clima underground e subterrâneo. Conversando com Fábio, decidimos não utilizar lâmpadas cinematográficas. A solução foi a construção de uma grande gambiarra que percorreria o Sarcófago com lâmpadas de diferentes luminosidades. Tenille ficou apreensiva com nossa idéia, em virtude desse material ter que passar pelo processo de transfer. O que requer uma atenção maior em relação às regiões escuras e o contraste.
Apostamos na idéia. Pensamos de imediato em Zé Bola (gente boa e pau pra toda obra) para montar a iluminação com a gente. A produção comprou o material necessário e, no dia seguinte, fomos para o Sarcófago. Ainda não estávamos com nosso uniforme de filmagem. Vou explicar...para suportar a insalubridade do ambiente desenvolvemos EPI’s básicos: Um macacão devidamente personalizado, botas sete léguas, óculos de proteção, luvas e mascaras de ar. Estava um pouco inserto sobre a necessidade do aparato, mas, no processo percebi que foi uma ótima idéia.
Voltando à iluminação, ainda sem o uniforme, adentramos no espaço. Zé Bola foi apresentado para Jayme, e automaticamente recebeu o apelido de Gordo, hoje já substituído por Elétrico. Jayme tem esse habito de colocar apelido nos outros. Toda a equipe já tem. Jayme ainda trabalhava no muro, preparando o cimento e colocando os blocos, o que nos deixou bem à “vontade” para o serviço elétrico. Cimento, barro, água, “passada” pra tudo quanto é lado. E é claro uma ótima conversa. Em poucos minutos já suávamos como cuscuz. Não existem janelas no Sarcófago, apenas um sistema de ventilação desenvolvido por Jayme que ninguém acreditava que funcionava até desligarmos ele para o teste do som. Acho importante para um bom entendimento informar que o Sarcófago se resume, em termos de espaço para circulação, em três ambientes de 2m² no primeiro andar e um de 4m² no segundo. É extremamente complicada a movimentação nele.
Como não poderia deixar de ser, a instalação elétrica da casa de Jayme é complexa. A fiação, um emaranhado de fios coloridos e desencapados, fica no atelier, já a resistência fica na casa do vizinho. Beleza, até então isso não era problema. Zé Bola adentrou a florestas de fios e começou o serviço. Depois de algumas horas, entre saídas e entradas, pois ninguém consegue permanecer por mais de meia hora no Sarcáfago, começamos a perceber a iluminação. Zé era só suor. O espaço ganhou profundidade, para qualquer ponto que olhássemos víamos luminosidade, todos estávamos satisfeitos. Só faltava Zé colocar mais duas Lâmpadas e pronto. Mas como o Diabo mora nos detalhes, quando fomos fazer o ultimo teste tudo veio abaixo. BLACK, ficamos no breu total. Só se ouvia o sorriso inconfundível de Jayme. Hi,hi,hi,hi,hi,hi!
Zé pulou o portal do Sarcófago e em alguns minutos conseguiu religar tudo. Contou que chegou no exato momento em que o vizinho saia para comprar pão. Jayme ficou surpreso que o tal de Julhinho, Tuninho, sei lá, tenha deixado Bola entrar para ligar a resistência. Ficamos aguardando o diagnóstico de Zé. Dava para perceber que ele foi pego de surpresa pela queda. Todos concordaram que deveria ter sido devido a quantidade de lâmpadas. Mas, se a resistência não estava agüentando as lâmpadas como iria agüentar a máquina de solda, geladeira, microondas e compressor que ainda entrariam ali? Zé revirou, desarmou, desencapou, conectou toda a gambiarra. Após alguns minutos anunciou: Vou plugar! Todos apreensivos....PLAC, BLACK. Já era noite. Dessa vez não ouvimos risada alguma. Saímos os três do Sarcófago. Jayme ficou. Levamos cerca de 30 minutos esperando a boa vontade dos vizinhos para abrir a porta. Até que um namorado de uma das moradoras, que já tinha aparecido algumas vezes na janela, chegou. Em alguns segundos a senhorita se animou a descer do terceiro andar para abrir a porta. Claro que nesse intervalo tive que comprar algumas velas e isqueiro para Jayme não ficar no escuro. Pois bem, luz novamente ligada, voltamos ao atelier. Pensa daqui, pensa de lá, eis que surge o protagonista da historia: O Bocal. Os fios do um dos bocais estavam em curto, derrubando o pobre do Zé Bola. Alivio geral, poderíamos ligar a luz, geladeira, fogão, elevador, o que quiséssemos, pois a instalação elétrica de Jayme é o ouro e Zé é foda!
Vale lembrar que para que esse passatempo transcendental ocorresse contamos com os serviços de Inailton, Carol e Eliana.
A primeira tarefa/oferenda indicada por Jayme foi a construção de um muro dentro do seu atelier. Uma de suas paredes tinha um recuo, um espaço quadrado, que dava para baixo da escada dos vizinhos. Segundo Jayme, e depois constatamos que era verdade, todo o som gerado no atelier/sarcófago poderia ser escutado pelos vizinhos. Longe de ser uma paranóia. Pelo que pudemos conhecer dos vizinhos de Jayme, Dona Florinda perde. Isso é um fato. Nenhum dos outros moradores do casarão gostam da presença dele. Acreditam plenamente que todos os ratos e baratas do Pelô saem da casa de Jayme. Antes do muro, uma das formas inventadas por Jayme para combater a bisbilhotagem da vizinhança, foi sintonizar uma freqüência extremamente aguda de rádio que ressoava 24h por dia. E ainda de quebra, segundo o mesmo, espantava os insetos de seu atelier. Para Jayme uma medida extremamente útil, para nós, um imenso problema pois, como iríamos captar o som direto? Melhor subir o muro!
Não tínhamos plano de filmar o processo do muro. Então enviamos 150 blocos e um saco de cimento para o Sarcófago. Jayme tinha pedido 300 blocos, mas fiz meus cálculos virtuais na parede dele e achei que seria de mais. Mais tarde vi que estava certo.
O segundo passo antes das filmagens era a iluminação do Sarcófago. Esse foi um ponto bastante discutido entre a equipe. Eu, Fábio (diretor de fotografia) e Tenille (Produtora Executiva) quebramos a cabeça pensando na maneira ideal para iluminar o iluminável. Bom, nas minhas primeiras idas ao Sarcofago, ele era praticamente um breu, uma luz fraca, velas e uma TV desintonizada. Para o olho humano e para a PD-150 da época a luz ficou fantástica. Foi na época do Projeto Figuraça. Já se vão 4 anos. Hoje o atelier está alguns milímetros mais arejado, iluminado por uma única lâmpada de 500, que acaba não alcançando os becos e cantos do Sarcófago.
Bem, aquela iluminação quente, obscura, da época da minha primeira visita não saia da minha cabeça. Queria de alguma forma manter aquele clima underground e subterrâneo. Conversando com Fábio, decidimos não utilizar lâmpadas cinematográficas. A solução foi a construção de uma grande gambiarra que percorreria o Sarcófago com lâmpadas de diferentes luminosidades. Tenille ficou apreensiva com nossa idéia, em virtude desse material ter que passar pelo processo de transfer. O que requer uma atenção maior em relação às regiões escuras e o contraste.
Apostamos na idéia. Pensamos de imediato em Zé Bola (gente boa e pau pra toda obra) para montar a iluminação com a gente. A produção comprou o material necessário e, no dia seguinte, fomos para o Sarcófago. Ainda não estávamos com nosso uniforme de filmagem. Vou explicar...para suportar a insalubridade do ambiente desenvolvemos EPI’s básicos: Um macacão devidamente personalizado, botas sete léguas, óculos de proteção, luvas e mascaras de ar. Estava um pouco inserto sobre a necessidade do aparato, mas, no processo percebi que foi uma ótima idéia.
Voltando à iluminação, ainda sem o uniforme, adentramos no espaço. Zé Bola foi apresentado para Jayme, e automaticamente recebeu o apelido de Gordo, hoje já substituído por Elétrico. Jayme tem esse habito de colocar apelido nos outros. Toda a equipe já tem. Jayme ainda trabalhava no muro, preparando o cimento e colocando os blocos, o que nos deixou bem à “vontade” para o serviço elétrico. Cimento, barro, água, “passada” pra tudo quanto é lado. E é claro uma ótima conversa. Em poucos minutos já suávamos como cuscuz. Não existem janelas no Sarcófago, apenas um sistema de ventilação desenvolvido por Jayme que ninguém acreditava que funcionava até desligarmos ele para o teste do som. Acho importante para um bom entendimento informar que o Sarcófago se resume, em termos de espaço para circulação, em três ambientes de 2m² no primeiro andar e um de 4m² no segundo. É extremamente complicada a movimentação nele.
Como não poderia deixar de ser, a instalação elétrica da casa de Jayme é complexa. A fiação, um emaranhado de fios coloridos e desencapados, fica no atelier, já a resistência fica na casa do vizinho. Beleza, até então isso não era problema. Zé Bola adentrou a florestas de fios e começou o serviço. Depois de algumas horas, entre saídas e entradas, pois ninguém consegue permanecer por mais de meia hora no Sarcáfago, começamos a perceber a iluminação. Zé era só suor. O espaço ganhou profundidade, para qualquer ponto que olhássemos víamos luminosidade, todos estávamos satisfeitos. Só faltava Zé colocar mais duas Lâmpadas e pronto. Mas como o Diabo mora nos detalhes, quando fomos fazer o ultimo teste tudo veio abaixo. BLACK, ficamos no breu total. Só se ouvia o sorriso inconfundível de Jayme. Hi,hi,hi,hi,hi,hi!
Zé pulou o portal do Sarcófago e em alguns minutos conseguiu religar tudo. Contou que chegou no exato momento em que o vizinho saia para comprar pão. Jayme ficou surpreso que o tal de Julhinho, Tuninho, sei lá, tenha deixado Bola entrar para ligar a resistência. Ficamos aguardando o diagnóstico de Zé. Dava para perceber que ele foi pego de surpresa pela queda. Todos concordaram que deveria ter sido devido a quantidade de lâmpadas. Mas, se a resistência não estava agüentando as lâmpadas como iria agüentar a máquina de solda, geladeira, microondas e compressor que ainda entrariam ali? Zé revirou, desarmou, desencapou, conectou toda a gambiarra. Após alguns minutos anunciou: Vou plugar! Todos apreensivos....PLAC, BLACK. Já era noite. Dessa vez não ouvimos risada alguma. Saímos os três do Sarcófago. Jayme ficou. Levamos cerca de 30 minutos esperando a boa vontade dos vizinhos para abrir a porta. Até que um namorado de uma das moradoras, que já tinha aparecido algumas vezes na janela, chegou. Em alguns segundos a senhorita se animou a descer do terceiro andar para abrir a porta. Claro que nesse intervalo tive que comprar algumas velas e isqueiro para Jayme não ficar no escuro. Pois bem, luz novamente ligada, voltamos ao atelier. Pensa daqui, pensa de lá, eis que surge o protagonista da historia: O Bocal. Os fios do um dos bocais estavam em curto, derrubando o pobre do Zé Bola. Alivio geral, poderíamos ligar a luz, geladeira, fogão, elevador, o que quiséssemos, pois a instalação elétrica de Jayme é o ouro e Zé é foda!
Vale lembrar que para que esse passatempo transcendental ocorresse contamos com os serviços de Inailton, Carol e Eliana.
Texto: Daniel Lisboa (Diretor)
Desenho: Jayme Fygura
Foto Making Of: Inailton Pinheiro
Desenho: Jayme Fygura
Foto Making Of: Inailton Pinheiro
quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009
quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009
quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009
SIMULTANEAMENTE DENTRO E FORA
Não sei bem quando, nem exatamente onde o primeiro contato audiovisual (sensorial) se deu. O que sei é que naquele instante se tornava impossível ignorar a presença dessa entidade que cortava a cidade como uma nota rebelde de Rock’n Roll.
Fiquei amontoado de questionamentos: Ele é verdadeiramente isso ou é apenas uma performance? De onde vem essa força? O que o move?
Não demorou para descobrir que esse ser que habitava o intermezzo entre um pós-Exú e um pré-ciborg se chamava Jayme Fygura: Negro, pobre, suburbano, punk.
Aos poucos fui me aproximando, com o respeito e a reverência que se deve ter a um mestre, mas não um mestre comum, qualquer, mas um mestre formado nas trevas, no submundo, na morbidez, impregnado de miséria, dor, fome e Rock’n Roll.
Como se já não bastasse todo o ritual de perambulação, revestido por uma armadura de ferro, alumínio, madeira, pano e cobre, descobri que todo esse conhecimento underground tinha um templo: O SARCÓFAGO.
O contraste causado pelas enormes portas de barro e ferro do atelier, com a arquitetura colonial do Pelourinho é impactante. A impressão é que o Sarcófago, uma espécie de instalação arquitetônica pós-moderna, emergiu de camadas inferiores da terra, como um portal para dimensões infernais, que se mantém ali, impávido, respirando e rosnando, ao lado de restaurantes e pousadas do Centro Turístico.
A oportunidade de adentrar no SARCÓFAGO, me fez entender como a obra de Jayme está pra além de suas vestimentas, da genial confecção de suas indumentárias, tão conhecidas pelas ruas da cidade. Mutações, processos alquímicos, enigmas seculares e mistérios inusitantes. No SARCÓFAGO Jayme está em sua própria carapaça, simultaneamente dentro e fora, como um controlador supremo, executando seu complexo processo de criação: A estética das FARPAS RELUZENTES.
Meu desejo é que o filme que estamos construindo sobre esse fabuloso artista funcione não apenas como uma ferramenta de propagação da sua vida e obra, mas, para além disso, se apresente como uma extensão da própria obra, sendo mais um dos inúmeros elementos que compõem esse universo obscuro.
Fiquei amontoado de questionamentos: Ele é verdadeiramente isso ou é apenas uma performance? De onde vem essa força? O que o move?
Não demorou para descobrir que esse ser que habitava o intermezzo entre um pós-Exú e um pré-ciborg se chamava Jayme Fygura: Negro, pobre, suburbano, punk.
Aos poucos fui me aproximando, com o respeito e a reverência que se deve ter a um mestre, mas não um mestre comum, qualquer, mas um mestre formado nas trevas, no submundo, na morbidez, impregnado de miséria, dor, fome e Rock’n Roll.
Como se já não bastasse todo o ritual de perambulação, revestido por uma armadura de ferro, alumínio, madeira, pano e cobre, descobri que todo esse conhecimento underground tinha um templo: O SARCÓFAGO.
O contraste causado pelas enormes portas de barro e ferro do atelier, com a arquitetura colonial do Pelourinho é impactante. A impressão é que o Sarcófago, uma espécie de instalação arquitetônica pós-moderna, emergiu de camadas inferiores da terra, como um portal para dimensões infernais, que se mantém ali, impávido, respirando e rosnando, ao lado de restaurantes e pousadas do Centro Turístico.
A oportunidade de adentrar no SARCÓFAGO, me fez entender como a obra de Jayme está pra além de suas vestimentas, da genial confecção de suas indumentárias, tão conhecidas pelas ruas da cidade. Mutações, processos alquímicos, enigmas seculares e mistérios inusitantes. No SARCÓFAGO Jayme está em sua própria carapaça, simultaneamente dentro e fora, como um controlador supremo, executando seu complexo processo de criação: A estética das FARPAS RELUZENTES.
Meu desejo é que o filme que estamos construindo sobre esse fabuloso artista funcione não apenas como uma ferramenta de propagação da sua vida e obra, mas, para além disso, se apresente como uma extensão da própria obra, sendo mais um dos inúmeros elementos que compõem esse universo obscuro.
Texto: Daniel Lisboa (Diretor)
Foto Still: João Ramos
Foto Making Of: Inailton
quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009
segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009
O EFEITO COLATERAL DA OBRA
;o que interessa a um filme são os acontecimentos, aquilo que jamais se repetirá...nesse filme em especial – O SARCÓFAGO – o que interessa são os setores ligados a miséria, a dor, a guerra, a morte e ao êxtase de um homem-máquina....comecemos pelo primeiro setor...;estávamos indo montar a luz na Uzynanucleatelier de Jayme Fygura...e fui pensando durante o trajeto sobre a interpretação de forças com a equipe, sobre a experimentação de quadros, sobre o cálculo de problemas que teríamos pela frente...logo em seguida...quando as gambiarras já estavam incrustadas na parede de barro...quando o objeto arquitetônico, a criação do espaço nos chamava para o ato fílmico...quando a presença do diretor, suas diretrizes e seus furores secretos se confundiam...quando a presença do fotógrafo e o ato fotográfico (o gesto de fotografar)...se sobrepunham...quando a relação da equipe com o plano de composição se mixavam...nesse instante a narrativa tomava dimensões transversais entre a imagem fixa da FYGURA de JAYME e a imagem em movimento que estávamos empenhados em concretizar...esse lugar do fotógrafo na era digital...esse antipoeta das cores...o pintor de irrealidades...ou como quer que o chamemos...somado com a dimensão conceitual e pragmática do maestro...do diretor-montador...e ao estado crepuscular de um artista verdadeiramente visual...era - digamos - o começo de uma demonstração de admiração mútua...e certo embasbacamento em evidenciar os quadros em perspectiva geométrica de uma salvador cínica e trágica...e por vezes dramática...atravessada pelo corpo-obra...; com a natureza de Exú...o preto e o vermelho...revelaremos um paradoxo entre o dentro e o fora....a exterioridade e o interior através de cores quentes e sombras recortadas...a dor de um artista na miséria social...mas ainda assim imbuído de uma força esplêndida que será encarada através das lentes de um grafista não menos miserável...daí a duplicidade do encontro...a triplicidade melhor dizendo...quando pensamos na loucura da logística empunhada e materializada com certa doçura e brutalidade pelo compositor da obra...essa complementaridade do encontro...a densidade de um corpo-mídia...e a mídia densa de nosso corpo coletivizado...em busca de uma vibração...dos feixes luminosos e das camadas de flechas incendiárias...estamos...a bem da verdade...compondo a própria luminosidade da dor...com o calor, o frio do suor, a raiva, as intensidades, os pés inchados, a morte-vida de uma engrenagem em pleno vapor...produzindo velocidades na lentidão do centro...e trazendo da periferia...as texturas conceituais e a alucinação pungente de uma experiência física...no mínimo curiosa...mas é muito mais que isso...é a violação dos estereótipos da cosmogonia e dos sentimentos convencionais...e de certo modo...é o que faz da nossa vontade...uma densidade corpo-midiática...um homem “morto-imortal”...um narrador-personagem do próprio relato...uma objetiva-objeto do discurso...sob um contraluz difuso entre a vala comum da política e da poética...é também um território antropomaquinomorfizado... ;vejamos, portanto, alguns momentos que ilustram a maneira pela qual incursionamos pela experimentação desse campo cinemático...: os três primeiros dias de filmagem no SARCÓFAGO...chamamos erroneamente de Setor da limpeza...nesses primeiros passos o homem-máquina...e tudo aquilo que comumente designamos de lixo fazia uma diligência cautelosa...já que tudo ali era simplesmente matéria de composição...máquina abstrata em estado crepuscular...um lugar fora-de-lugar...material inútil era ,pois, material embaçado e nublado, agrupamento molecular...donde as peças do jogo estavam, de certo modo, embaralhadas...não podíamos dizer o que deveria sair sem antes pensarmos numa primeira contradição...embora desaprove essa vertente da contemporaneidade (a reinvenção do corpo pela máquina)...as mutações do corpo-obra de Jayme eram ,de todo modo, mutações de superfície maquínicas...reinvenções profundas do corpo-espírito através de petrechos, utensílios, material subjetivo e arcaico...uma segunda pele...e tudo isso era mesmo necessário para as metamorfoses...todo esse material inutilizado para “homens comuns”, ou melhor, seres acidentalmente cotidianos...era um desejo de potencializar ainda mais a carapaça esplêndida...jamais poderíamos reduzir a imagem dos materiais à uma função social...LIXO!?
Leia o Texto Completo em:
http://cavalodocao.multiply.com/journal/item/40/O_EFEITO_COLATERAL_DA_OBRA
Texto: Fábio Rocha ( Diretor de Fotografia )
Fotos Making Of: Inailton
domingo, 15 de fevereiro de 2009
FARPAS 29.01
Para Maior Visualização:
http://www.flickr.com/photos/curtaosarcofago/3282320473/sizes/l/
Já se pode ouvir o som que vêm do SARCÓFAGO...
A UZYNANUKLEARATELIER inicia seu funcionamento...
O processo de MORBITALIZAÇÃO começa a surtir efeito...
Com molduras e FARPAS RELUZENTES o espírito expõe a dor, do amor a ARTE.!
A UZYNANUKLEARATELIER inicia seu funcionamento...
O processo de MORBITALIZAÇÃO começa a surtir efeito...
Com molduras e FARPAS RELUZENTES o espírito expõe a dor, do amor a ARTE.!
terça-feira, 10 de fevereiro de 2009
UZYNANUKLEARATELIER
Um castelo. Mas para isso, é preciso muito. Muitos blocos para serem empilhados. Castelos custam demais, e os blocos não vieram. Ou vieram, tarde demais. Antes veio a morte. A morte está sempre no encalço da vida. E na ausência de castelo, foi preciso construir o próprio túmulo.
O sarcófago. Um lugar para deitar a carne cansada. E se o cansaço vencer, já se fica por lá mesmo. No sarcófago. Dentro do seu mundo, da sua realidade. Onde é possível se encontrar, se entregar, se sacrificar. O sarcófago. Pensamento, sonho, ilusão. A vida lá fora é muito cruel. O sarcófago. Nada melhor para quem sempre andou perto demais da morte.
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